Telma de Jesus Laborinho Ferreira
Comecei a masturbar-me enquanto via o maestro António Vitorino de Almeida no seu programa televisivo, de sons e tempos. Comecei de forma um pouco indecisa, sem saber bem, qual o meu interesse em criar tal sessão, talvez por estar muscularmente descontraída, horizontalmente confortável, talvez por ser uma noite fria, nas noites frias normalmente refugio as minhas mãos geladas no meu corpo quente, perto da pélvis, ficam demasiado próximas do sexo, é impossível não ouvir o grito do encanto genital a chamar por mim...,comecei lentamente e sem grande excitação, até porque, em termos de fantasia estimulante, olhar para o maestro e assistir à poluição sonora de um filme pornográfico, gritos-hipérboles, cenários e sequências de rir pelo ridículo, com postas de carne decorativas a fazerem coisas do melhor, provoca-me uma sensação semelhante, sinto uma inevitável vontade de ser-me assexual, de fazer-me coisa sem sexo, já tinha começado a tocar-me e pensei que seria de mau tom parar ali, com os dedos bem dentro, a excitação demorou muito a vir, ainda muito seca, cansada de insistir no auto-manejo, mas ainda muito seca, continuo a olhar, mas agora, vejo-o de modo totalmente diferente, a imagem aparece centrada no percurso das mãos, as mãos a invadirem as teclas, e eu a sentir uma enorme necessidade de ter a violenta eficácia daquelas mãos devoradoras de notas, no gesto perigosamente automático, aquela melodia tão audível quanto imperfeita, sons sem casa e uma estabilidade assustadora, necessidade de ter aquela dinâmica formal com um carregar incoerente no meu clitóris, uma partitura de Debussy no meu húmido espaço aberto, começava agora a sentir que valia a pena continuar com as duas mãos, a esquerda no interstício, a direita no ponto exacto, continuava a apreciar todos os meus movimentos, mantinha o corpo em rebeldes embalos, até que os dedos começam a deslizar com uma facilidade que mereceu a minha aprovação, estava praticamente livre, o programa acabou e eu fico atenta ao desequilíbrio do pensamento, respiro em ritmo acelerado, sem soltar gemidos-vibrato para não ferir ouvintes sensíveis, agora sim estou bem molhada, quase a vir-me, não consigo focar qualquer pormenor exterior, não tenho memória perceptível aqui, não há definição possível, sinto e pronto, venho-me sempre com a ausência de qualquer coisa, há quase uma ausência de tudo, há uma ausência de morte, fecho os olhos, a sensação é demasiado intensa para querer abri-los, e o reflexo de fechar é quase um querer congelar aquele instante em que os contornos do corpo parecem desaparecer e ando pela cama a regalar-me no imprevisível caminho do lençol, também este com um certo aroma a presença, cheiro de cama cheia, ocupada, e penso que é o único momento-só em que a morte não existe, em que não há qualquer noção capaz de, naquele preciso momento, definir-me enquanto coisa finita, vir-me altera-me na morte por completo, mas o tempo de tal êxtase, é curto, muito pouco, um encontro de troca imediata, sem o despertar dos ponteiros, sem um nítido pensar de morte, contudo tamanha ausência não consegue ser contínua, momentos de sensação extrema, momentos de vida, um atingir a altitude máxima do pensar em branco e voltar ao real/morte na consequente queda, é não conseguir manter a vida por mais que uma mão de segundos, portanto, a vida é o sentir em branco de um orgasmo e viver é fisicamente impossível, já que o corpo é incapaz de permanecer em constantes narrativas de convulsões orgásticas, eis a minha profunda conclusão...,tenho os dedos marcados por engelho, foram múltiplas as tentativas de ficar-me ali, acabei por fartar-me das quebras, da chatice que é quebrar no momento certo, de uma sensação que pára contra a vontade, levanto-me e arrefeço, tenho as pernas a escorrer em líquidos, que em parte desconheço, o esforço que me transpira, não estou a viver e desisto, de dedos tristes e deformados pelas dobras na pele, outrora tão potente e agora que a vejo com memória definida parece-me despida de imaginação, como se a masturbação fosse a única forma de entender que não há qualquer espasmo demorado, qualquer nota, por mais quase ida, enquanto vida, que morrer é isto, um caminho completamente descontínuo e que o futuro é sempre a aproximação do esquecimento, lavo-me ainda com o sabor do meu lado interno e volto a deitar-me, agora para dormir e sonhar com esses segundos inconsoláveis, dentro dos quais gostaria de ficar, segundos parados e uma sensação de vida fixa no meu corpo.
segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
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4 comentários:
telma, que linguajar é este? olhe que te boto num colégio interno... devias ter o teu ppo blogue de poesia, eu vou deletar o meu, cuspo em cima do que ja escrevi, ahahahah
um verdadeiro recital de bandolim. Just kidding
Bem o que eu vim descobrir enquanto andava a navegar por esta Net :|
Tás lá jovem.
bela musica de encantos subtis, nada estranhos.
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